quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

Primavera

Essa não é uma história qualquer,
De quem passa e vive para contar
Ela não fala só de amor
Nem só de guerra ou de luar.
Era uma vila tipo dessas
Que tem casa tem bar e tem João,
Uma vila com nome de Santo,
Daqueles que de tão conhecidos
Sempre lembram em canção.

Nessa Vila tinha Maria, de Nada, só Maria
Tinha Padre e tinha festa, tinha festa como tinha.
Nessa Vila tinha Ribeirão, com muito peixe, como tinha,
Só que na Vila não tinha José, só João era que tinha.

No coração de Maria tinha nada, tinha só alegria
Mas na vontade de João, quem reinava era Maria.
João tinha dinheiro, tinha fazenda como tinha
E Maria nem ligava, nem olhava, nem lhe via
E João só cobiçava, da Maria a companhia.

Pai de Maria era pobre, ganancioso, como era.
Mãe de Maria era Santa, desde a última primavera.
Pai de Maria assuntou João interesseiro quem diria
Sem se fazer de rogado fez da filha mercadoria.
João cheio de pompa não cabia em seu orgulho.
Pai de Maria lavou a égua e ofereceu até embrulho.

Mas na Vila não tinha José, pelo menos até agora.
Chega um dia peão novo, sem pressa de ir embora.
Tá de passagem não se sabe, se vem de longe, vem a pé.
Se até agora não tinha, quem tem agora é José.
José não tem dinheiro, não tem fazenda, tem nada não
José não tem trabalho, não tem casa, igual tem João.

Mas na Vila tinha muita festa, tinha festa como tinha
E tem Festa de Santo pra José assuntar Maria
Mas na Vila tinha Jagunço, de João como tinha
Que cuidava de tudo que era dele nesse caso até Maria
E na Festa tinha dança, tinha dança como tinha
Vira roda, roda e meia, roda e meia roda e vira.
Mas quando bate no peito, aquele olhar José e Maria
Não tem Jagunço, não tem João, que destrua essa alegria.

Pai de Maria que agora tinha dinheiro como tinha,
Quis saber quem era José, o que fazia de onde vinha.
Ouriçou para João sobre o interesse em sua filha
De um Peão que vinha de longe, que tinha nada, nada tinha.
João mandou Jagunço ficar de olho em sua Maria,
José que não chegasse perto daquilo que te pertencia.
José veio de longe, tinha nada, nada tinha
Tinha nem medo de João, de Jagunço ou Pai de Maria.
José não tinha casa, dormia ao lado do Ribeirão
Travesseiro era mato, sua cama era o chão.
José ficou sabendo, da intenção do João
Que além da vida de Maria, comprou sua execução
José que era esperto caboclo forte de estrada
Que nem poeira de chão sumiu na madrugada

Maria não comia só chorava, nem dormia
Não sabia de José, se era Santo ou se vivia.
Jagunço não voltava da empreitada de João,
Fazia três dias, desde a ordem do patrão.
João que nem ligava para aquele que lhe servia
Já chamara outro Jagunço, para sua cercania.

Pai de Maria estava doente, tinha febre como tinha,
Gastou dinheiro com remédio o que podia e não podia.
Chamou Padre, chamou Maria, chamou João no desespero
Preocupava-se apenas com o fim de seu dinheiro.
Fez reza, fez macumba, fez até simpatia.
Em pouco tempo virou Diabo, porque Santo não podia.

Maria era agora sozinha nesse mundo
Não que não fosse antes com um Pai vagabundo.
Maria era triste era triste como era,
Lembrava só da mãe, Santa desde aquela primavera.
João era ruim, nem compaixão ele sentia
Queria era logo poder casar com a Maria.

João tinha dinheiro, tinha dinheiro como tinha
Não tinha era pena, nem respeito por Maria.
João tinha comprado, e queria receber
Aquela Maria que o Pai quis vender.

Na Vila tinha festa, tinha festa como tinha,
Nesse dia era casamento de João e de Maria.
Maria não andava, não sorria nem sentia
João fazia mostrar tudo o que o dinheiro podia.
Mas a festa era estranha, não tinha dança nada tinha,
Não tinha roda, roda e meia, meia roda, roda e vira.
Na festa não tinha riso, não tinha música nada tinha,
O que tinha era aflição, e a tristeza de Maria.

Na igreja não tinha gente, não tinha santo nada tinha
João tinha mandado, queria Ele o Padre e Maria.
Na porta tinha Jagunço, tinha Jagunço como tinha
Por medo de alguém atrapalhar a homilia.
  
Mas José que era esperto era esperto como era
Esperou naquele forro da igreja que era velha.
Fez de morto de sumido, pra agir na hora certa.
Na igreja que era o Padre, João e Maria
Agora tinha José, que era bom de pontaria.
Igreja que era santa, mas sem Santo no altar
Fez José de um tiro só, matar João sem piscar.

José que era esperto, era esperto como era
Tinha cavalo já selado tudo a sua espera.
Maria que era triste, era triste como era
Viu de novo alegria naquela próxima primavera.

E tem gente que até hoje conta
Que esses dois vivem juntos
Faz tempo nas estradas
Fugindo dos Jagunços.
De tarde quando é tarde
Que tem sol e tem lua
Vê João e vê Maria

De cavalo pela rua.

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